sábado, 21 de agosto de 2010

Terceiro Mistério

Estava descalça, vestida de preto, cabelos loiros, uma imagem emoldurada no peito. Ainda não era noite de todo e ele podia ver que meus olhos eram grandes e meu rosto, embora um pouco desfigurado, diferente de tudo que encontrou. Mesmo ele, que nem estava na cidade há muito tempo, sabia da minha doença. Mas na breve duração de um olhar, o primeiro que trocamos e que já nos uniu com tudo que isso implica, viu em mim apenas a adolescente arrancada da imobilidade e cegueira para ir ao seu encontro e descobrir-lhe. Teve, ignorante que era, a sensação de agraciado, certo de que em mim a enfermidade fora, mais que uma pena, um desígnio de resguardo até esse minuto, e que em mim estavam as venturas da vida, e que, ligando-se a mim se apossaria de riquezas que não podia entender ou adivinhar. Atingido nas profundezas por um olhar, ofereceu-se com a máxima candura, imaginando que o brio de seu espírito podia comprar a paz e o júbilo. Desconhecia que essa flecha lançada pelas mulheres é semente cujos frutos ninguém pode antever, e que as alegrias seriam quase nenhumas ante os sofrimentos e as depredações em nossas vidas, sobretudo em minha existência, sua vítima.

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